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  • Foto do escritorCaroline Duarte Matoso

União das Mulheres Rio-grandinas: a participação feminina no movimento operário de Rio Grande (década de 1950)

A União das Mulheres Rio-grandinas (UMRG), criada pelo Partido Comunista do Brasil (PCB) em 1946, tinha como objetivo principal envolver as trabalhadoras na luta por condições de vida melhores, especialmente contra o aumento dos preços dos alimentos de primeira necessidade. Na época, o PCB adotava a estratégia de "união nacional" contra o fascismo, formando parcerias com diferentes grupos políticos. Isso permitiu que mulheres com diversas visões políticas e filosóficas participassem da UMRG.


Desde 1932, as mulheres conquistaram o direito de votar e serem votadas, o que chamou a atenção de grupos políticos interessados em expandir sua base de apoio eleitoral. Ao buscar a participação ativa das mulheres na esfera pública, as militantes da UMRG desempenharam um papel fundamental na ampliação da cidadania feminina. Elas conscientizaram as trabalhadoras, incentivando-as a serem protagonistas em um ambiente que, por muito tempo, lhes foi negado. Conforme sua ata de fundação, a UMRG tinha como princípio, “congregar, em seu seio, todas as rio-grandinas de boa vontade, sem distinção de crenças políticas ou religiosas” (União das Mulheres Rio-grandinas, 1946, p. 1). Entre as personagens mais conhecidas associadas à UMRG, destacam-se a tecelã Angelina Gonçalves e a vereadora Guaraciaba Cardoso e Silva (PSP, 1948-1951).


Angelina Gonçalves, nascida em uma família pobre natural de Rio Grande, começou a trabalhar como tecelã na Fábrica Rheingantz aos treze anos. Mãe solo, ela se filiou ao PCB em 1945, quando o partido conquistou sua legalidade. Um ano depois, Angelina desempenhou um papel fundamental na criação da UMRG, evidenciando seu compromisso em envolver as trabalhadoras em questões políticas. Durante uma manifestação em comemoração ao Dia Internacional do Trabalhador em 1950 no município de Rio Grande, Angelina foi atingida por um disparo de arma de fogo, proveniente de agentes de segurança do Estado. Nesse episódio também foram assassinados: o pedreiro Euclides Pinto, o ferroviário Osvaldino Correa e o portuário Honório Alves, sendo este evento conhecido como o “Massacre da Linha do Parque”.

 

Guaraciaba Cardoso e Silva, nascida em 24 de dezembro no município de Rio Grande, era enfermeira e mãe de três filhos. Assim como Angelina, ela desempenhou um papel fundamental na criação da UMRG. Na primeira diretoria da UMRG, em 1946, Guaraciaba ocupava o cargo de vice-presidente da entidade. No ano de 1947, o PCB participou das eleições municipais usando a sigla do Partido Social Progressista (PSP), devido à sua condição de ilegalidade e clandestinidade na época. Nesse pleito, dois vereadores comunistas foram eleitos: Vespasiano Faustino Corrêa e Antônio Rechia. Em 16 de novembro de 1948, Vespasiano Faustino Corrêa se afastou do cargo, sendo substituído pela enfermeira e militante da UMRG, Guaraciaba, que assumiu a vereança como sua suplente. Em seu discurso de posse na Câmara de Vereadores de Rio Grande, Guaraciaba expressou sua honra ao assumir o cargo de vereadora, destacando que isso lhe proporcionava "a oportunidade de continuar lutando, sem desânimo e vacilações, pelas reivindicações mais justas e profundas da classe operária, em especial, da mulher rio-grandina" (Ata n.º 192 da Câmara de Vereadores, 16 de novembro de 1948, p. 4/5).


Além de lutar contra o aumento dos preços dos alimentos de primeira necessidade, a UMRG desempenhou um papel significativo ao oferecer cursos de alfabetização para as mulheres de Rio Grande. Em uma matéria jornalística, as militantes da união feminina argumentaram que a instrução era "uma das melhores armas contra a exploração, a miséria e a ignorância. Mulheres esclarecidas podem educar melhor seus filhos e mostrar-lhes o caminho da liberdade, da paz e da felicidade" (Momento Feminino, 11 de setembro de 1950, p. 11). É crucial destacar que, naquele período, os índices de analfabetismo eram elevados, afetando principalmente as mulheres.


A UMRG justificava a importância da instrução feminina com base no papel social que as mulheres desempenhavam no trabalho de cuidado e reprodutivo, especificamente no exercício da maternidade. O grupo via a educação não apenas como um meio de capacitar individualmente as mulheres, mas também como uma ferramenta para torná-las agentes de transformação social, influenciando a educação de suas famílias.


Ao se distanciarem da concepção tradicional que limitava as mulheres ao papel de expressar sentimentos e emoções, as participantes da UMRG reconheciam nas mulheres a capacidade de pensar, agir no espaço público e exercer influência política. Elas assumiram um papel ativo e protagonista na luta por transformação social, rejeitando não apenas o modelo tradicional de feminilidade da época, mas também construindo uma nova representação do papel feminino. Essa nova representação da mulher não a retratava mais como frágil e sentimental, como era tradicionalmente concebido, mas sim como uma figura ativa, dotada de intelecto capaz de intervir no cenário das decisões públicas.


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Esse texto é de autoria da historiadora Caroline Duarte Matoso. Caroline é Historiadora, Mestre em História e Doutoranda em História pela UFRGS. É coordenadora do GT Mundos do Trabalho ANPUH/RS.

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